OLÁ, AMIGOS!

Como retribuir ao universo a dádiva da vida, pensava. Agradecendo a Deus todos os dias. Dividindo com o mundo o que de melhor me ocorresse na alma, o que eu mais amasse em mim. E respondia à minha própria busca: Arte, a única coisa que diferencia os homens. Eis então minha oferenda ao mundo, minha contribuição para a humanidade: minha arte. Melodia como veículo de minha poesia e vice-versa, minha arte sou eu, levando a quem quiser ouvir minha forma de compor, escrever e cantar o universo e o acontecer das coisas que vivencio. O que canto ou escrevo é o que há de mais profundo em meu coração. Rogo por agradar a quem me ouvir ou ler. Benvindos e obrigado pela visita! Newton Baiandeira





segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

UM PRESÉPIO ANDANTE

A cidade recebe o natal, se impregna da aura de dezembro e a chama da paz acende as tochas e piras. À luz da cidade reflete nos olhos um brilho novo, mais instigante que o do minério a sóis e luas e o mais doce vale se acomoda ás almas e seus risos inteiros. As praças promovem a vidas de há muito sumidas encontros inusitados, abraços largos e apertos de saudades.

O natal entranha-se em tudo e todos, gente e lojas, presentes e saldar de dívidas. O beijo mais demorado, escandaloso e farto do casal de jovens me indica cumplicidades a mais, porque é dezembro? Sei lá! Sei que dezembro me faz abobado e vendo coisas mais do que havia ou via, sentindo gosto de chocolate com peru em tudo.

Nesses dias dezembrinos a oração do padre me parece mais célere, mas que nada, sou eu com mais paciência na igreja. Os joelhos já não reclamam das madeiras desiguais do banco. Olha só, me pego rezando alto, sem vergonha dos fiéis redores!

Aos sinos, entusiásticos, meu espírito avisa que lá vem inspiração. Decerto a nova canção será de paz e amor e há de trazer alguma contribuição pra harmonia do mundo, mais um presente de natal que poderei repassar ao meu redor.

A Praça Redonda tá cheia de luzes, o prefeito não se descuidou. Luzes de plástico, numa reciclagem de orgulhar quaisquer cristos, iluminando a pressa que leva à Noite Feliz. Logo o Coral da Fundação vai entoar a Canção de Natal e aí, senhores, eu vou às nuvens, quiçá, na carruagem de Papai Noel. Ah, não acreditam em Papai Noel? Então podem mandar pra mim todos os presentes que ganharem!

O “Presépio Andante” visita os bairros da cidade, uma fileira de gente galante empresta passos de sua melhor idade pra dar boas vindas ao Cristo, os meninos acompanham de riso grande, saltitantes por todo o percurso, o presente humano. Coisa de Marília Ramos, ao som dos tambores e alegorias, os Senhores da Vida Ativa vêm dizer ao Cristo que Itabira é um poço de fé e esperança e que o espírito natalino se consagra no coração do Homem de Ferro.

CANÇÃO DE PAZ

E do mar a brisa veio conversar
Então, já não estamos sós
Olha o sol que brilha, é manhã
Ouça o rouxinol!
Canta o sabiá!
Vê o azul-marinho
Canta o mar!
Todo o céu conspira
Toda, a terra dança
Pra acordar a criança
Perdida em nós!

CANÇÃO DE NATAL
É natal!
A paixão se refaz dentro de nós
Que a fraternidade, o perdão, a paz
Se traduzam nos homens de bem
Que do sol, o calor
Que do amor, a emoção
Venham aquecer nossos corações
Nesse novo tempo que se faz
Tempo bom pra desejar a você feliz natal!
Um ano mais feliz
Muita vibração
Que seu sonho possa se realizar
Que no ano que vem tudo corra bem
Muito amor em seu coração.
Feliz natal!

CANÇÃO PARA OS 300 ANOS

A cidade amanheceu tão bonita.
Revestida de alegria, em flor.
Do Cauê ao Pico do amor.
Desde o Centro Cultural,
Varando os casarões
Uma só diretriz.
Pelas leis do coração,
Cada cidadão tinha de ser feliz.
Bandas furiosas
Marujadas, corais.
Grupos de serestas
Violões, madrigais.
Homens, mulheres e meninos,
Cantos, hinos, no mais belo tom.
São 300 anos de história
De Itabira, terra de Drummond.
E toda a folia
Tomou conta da praça.
Maria Fumaça espalhando alegria.
E os homens de ferro
Em plena harmonia,
Gritavam aos berros
Viva a “Vila da Utopia”

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

BURRO ATÉ ENCOSTAR NA CERCA

Na linguagem que lhe era peculiar dizia Bastiana que o amor haveria de ser elegante, cordial e, principalmente, tolerante, compreensivo a humores e variações, caras e bocas do parceiro. Deveria o amante conceder ao amado o que lhe coubesse querer. Antecipar a oferta do que gostaria que a si fosse ofertado pela companhia.

“Esse negócio de só querer e mais querer sem nada dar estraga qualquer relação e desmancha casamentos que é uma beleza”. Esse papo para com as moças era sempre encerrado com a máxima: “marido, ruim com ele, pior sem ele”.

Se me encantava seu pensamento e seu falar sempre precedido de ações comprobatórias, a forma expressiva de linguagem e sua visão simplista e humanamente forte me levavam a contemplações constantes. A rigor, era a linguagem que eu queria pra minhas manifestações artísticas em que já, aos oito anos, projetava carreiras e profissões da área pra minha vida.

O rigor do jornalismo que impõe ao escritor formalidades, à extrema severidade eu achava que nunca poderia ser escritor. A não ser que freqüentasse por anos intermináveis as cadeiras das academias. Queria escrever, não a tão sacrifício!

“O estudo é base de tudo na vida. Ou você estuda ou vai ser burro até encostar na cerca!” Era ela no meu sempre! “Pra felicidade do espírito é sempre melhor que se fale exatamente o que se quer dizer. Pra escrever, se você souber o que quer dizer, o dicionário, pai dos burros, cuida de sinônimos bonitos pra cada palavra. Dá pra enfeitar tudo”.
“Só tem uma coisa, no fundo é tudo igual. Se você quer dizer bosta, qualquer outra palavra que o dicionário autorize poderá mudar a forma de expressão, mas vai feder na mesma intensidade. Bonita ou feia, merda, quanto mais mexer mais fede. Como nossa própria merda não deve atingir outros narizes, se queremos dizê-la bonito é melhor estudar muito antes de correr pro mundo”. Era ela, tudos e contudos costumeiros, minha mãe!

Aprendi a gostar de ler jornal com Dona Sebastiana e Seu Milino. Enquanto eles praticavam essa leitura quase diária, eu descobria ali os melhores momentos pra fugir pra arena de peraltices.

Estou, agora, lendo a matéria de um jornalista e quase posso tocar em sua angustiante vontade de impor sua verdade ao texto, de imprimir sua visão da história a uma matéria sobre o Haiti. Posso sentir seu sofrimento em se ater às vontades históricas e matemáticas, muitas vezes, injustas e não condizentes com os fatos.

Então, Bastiana, aqui não há merda escrita em sua acepção natural, mas fede pra danar.

Letra de Música:

A VIDA É BELA
Newton Baiandeira

Minha mãe plantou o coração
Á beira da linha do trem
Quando Juvenal se mandou
Numa carruagem pro céu
Seis filhos, nova e sem planos
Restaram só perdas e danos
Passam os anos, e ela com os olhos no trem
Mirando a vida da janela
A me ensinar os sonhos dela
Ó, como é bela a minha mãe vendo o trem
Minha mãe plantou o coração...
Me ensinou que ser honesto
Pode doer, mas é o correto
E que mais vale quem é do que quem mais tem
Poder mirar o seu espelho
Sem encarar olhos vermelhos
Entre conselhos, olhos parados no trem
Eu também plantei meu coração
Á beira da linha do trem
Quando Sebastiana se foi
Numa carruagem pro céu.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

UM OLHAR ITABIRANO SOBRE O POETA CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

O POETA
Newton Baiandeira

Ei-lo: palavra na boca do tempo,
Sentimento no coração do mundo.
Trilhos e trilhas da alma itabirana

CASAS
Newton Baiandeira

Numa, ele nasceu; noutra cresceu. Uma terceira, mais funda na memória, virou história de muitos pedaços. Poetas criam asas! Com tantas casas, ele preferiu pousar outros galhos do mundo.

ENIGMA
Newton Baiandeira
Às vezes me deito na rede e fico a imaginar o que se passa entre o retrato e a parede.

FALAS
Newton Baiandeira

Uns falam muito em Drummond duas vezes por ano.
Outros pouco, todos os dias.
Uns não falam, só sentem.
Outros nem sentem.
Drummond são todos os sentidos da palavra.
Itabira é o amor em todas as nuances da paixão,
dividida entre os que vivem nele,
os que vivem com ele e os que vivem dele.
Todos, de formas diferentes, o amam.
Por amor, dinheiro ou política.

SER ITABIRANO
Newton Baiandeira

Ser itabirano
é
Contar
Vagões
Reverenciar
Drummond.
E, numa eterna alquimia,
forjar de ferro e poesia,
um jeito especial de viver,
sonhar e administrar paixões.

MIRANTE
Newton Baiandeira

Há um poeta, longe, onde tudo é grande.
O mar é grande, a calçada é grande no seu mundo largo.
A pedra, as almas de ferro; os horizontes de noites brancas sem mulheres, ao longe contam distâncias no relógio da matriz.
Há um poeta longe.
Sua poesia vem aqui ao pé do ouvido, à vista dos olhos, à porta do coração.
Não há distância. No fundo, há um poeta no fundo da alma.

DUALIDADE
Newton Baiandeira

Poeta e pessoa
A diferença é coisa à toa
Um enxerga o outro vê
Um escreve o outro lê
Poeta e pessoa
A diferença é coisa à toa
Um caminha o outro voa.

UMA RUA ITABIRANA
Newton Baiandeira

Havia um poeta nessa rua. Guardo em meus olhos o mais pesado silêncio que sua ausência consentiu. Ele se foi. Talvez buscasse uma rima desgarrada, sei lá! Só sei que ele não voltou e o máximo que me permite é essa rua, encharcada de sua magia.

O CRAQUE
Newton Baiandeira

Pelé de palavra
Mané de penas tortas
Toque de gênio
Goal de letra


UM DIA DE MORTE
Newton Baiandeira

À tarde, o plantão jornalístico anunciou: faleceu hoje o poeta Carlos Drummond de Andrade.
Aqui, levantaram bandeiras e montaram palanque e fizeram discursos.
Silêncio! Pensei.
Na agonia desse instante, me pediram pra falar de Drummond.
- Mas Drummond não é palavra, é sentimento. Eu sinto muito!

VIAGEM
Newton Baiandeira

Agora eu sigo as ruas do azul, arrebatado, pleno de magia. Mergulho na utopia em busca de tudo que eu possa somar ao concreto que me circunda.

RECONSTITUIÇÕES
Newton Baiandeira

Vão reconstituir a “Fazenda dos Doze Vinténs” do poeta Carlos Drummond de Andrade. Que nobreza!
Não obstante, ela vai ser reerguida onde o “Maior Trem do Mundo” desova seus rejeitos.
Homens firmes e retos aplaudem. Homens flexíveis e tortos choram impotentes.
Dúvida atroz; às vezes, penso que a despeito da melhor das intenções, entregamos um guerreiro ao seu algoz.

O ILUSTRE VISITANTE
Newton Baiandeira

A porta está aberta, como sempre esteve nesta humilde casa. Estamos à mesa posta. Alimentamo-nos do pão de tua poesia; o que nos dá sustança pra tirarmos pedras dos caminhos de corações céticos e inseri-lo lá.
Havia dias em que empreendíamos toda energia que tínhamos sem resultado.
Então, recarregávamo-nos de tua palavra, voltávamos à carga e vencíamos todas as batalhas, uma a uma.
Foram tantas e árduas que não tivemos tempo de arrumar a casa para recebê-lo.
Não temos tapete de couro de anta nem há imagens do Santeiro Duval. Mas, no quintal há um jardim em forma de coração e nele, milhares de pés de ¨ Rosa do Povo”.
Entra, Carlos, seja bem vindo!

A TRÍADE
Newton Baiandeira

No Pico do Amor a arquitetura de Niemeyer, a poesia de Drummond e a escultura de Amílcar se encontram.
Mais que uma convenção de artes, uma generosa ceia das almas itabiranas. Do Cruzeiro o Cristo testemunha majestosa comunhão de Magnífica Trindade.


RESTOS MORTAIS
Newton Baiandeira

Um corpo que regressa à alma que nunca saiu daqui.
Que venham os ossos de corpo e ofício: restos mortais de um imortal.
Que venham o Rio, o mar, o mundo.
E os Portais de Niemeyer.
E a crônica de Afonso.
E a postura da média.
E os holofotes da mídia.
E as mulheres de horizontes perfeitos.
Que venha o tempo a tempo dar quintais a vida!

MEDITAÇÃO
Newton Baiandeira

Virá do ato a conseqüência
Da inocência a sabedoria
E, na agonia do entremeio,
A alma fatigada buscará a paz.

CAMARIM
Newton Baiandeira

Ao final do grande espetáculo amar a dor.
Assim como o amor que nos foi tanto e farto.
Como um parto que dói e dá frutos

sábado, 9 de outubro de 2010

A CIDADE, O POETA, A ALMA DO FERRO


A cidade de Itabira completa 162 anos de emancipação política. Carlos Drummond de Andrade, 108 de nascimento. A cidade comemora com festa. E o cantor, compositor e poeta itabirano, Newton Baiandeira celebra com seu Outubro Poético.

A ALMA DO FERRO
Newton Baiandeira

Na terra da poesia o que de mais havia são pedras no caminho. A pedra fala sem voz. A voz se cala e por quanto mais se cale, mais à pedra vale. Onde pedra havia já não há caminhos. Só e ferrais esculturas de um tempo porto, de um rumo torto pra versos largos. E ao conflito das almas ainda se bate palmas de mãos surradas. Tudo ou nada vale a pedra mais que o caminho quando não há rumo.

OS PIONEIROS
Newton Baiandeira

Quando escavadeiras eram unhas, Lectra hauls eram balaios. Nosso combustível era a esperança, fé num futuro promissor. A gente já explorava o minério e as indústrias artesanais afloravam.
Tropeiros e carroceiros, pioneiros homens de ferro escreveram lendas e a história de um desenvolvimento que até hoje não veio.

JARDINS
Newton Baiandeira

A cidade guarda jardins descabidos, com flores teimosas que superam descuidos e descasos e florescem altivas. Surgem imponentes, varando gretas do absurdo, soberbas.
Ao desleixo proposto, em sua fala de flor parecem dizer: - ora, não tem importância!

O CHAPÉU
Newton Baiandeira

No inverno, mansamente, a névoa se debruçava sobre o Pico. Uma fantástica performance da natureza, oferecida aos olhos das gerações passadas.
Da varanda de alguma casa, no Campestre, Antônio Francisco Martins Soares, embevecido de tamanha magnitude, exclamava: “Olha o Pico do Cauê colocando o chapéu!”

SER ITABIRANO
Newton Baiandeira

Ser itabirano é
Contar
Vagões
Reverenciar
Drummond.
E, numa eterna alquimia, forjar de ferro e poesia um jeito especial de viver,
sonhar e administrar paixões.

AS PEDRAS
Newton Baiandeira

Tiraram as pedras das ruas e meus pés perderam a direção. Outros caminhos maiúsculos e sem pedras em seu meio os conduzirão ao ouro fácil, imaginam eles. Entre as pedras e os meus pés, algo suspenso, sigo em linha reta, abnegado, abengalado.
Apenas caminho sobre o moderno projeto, catando ausências, contando maus-olhados de homens que, cegos, não olham onde pisam. Vesgos, não pisam onde olham.

ARTE NO MURO
Newton Baiandeira

Uns trabalham na “segunda mineradora do mundo”. Outros e liberais pequenas empresas e salários os acolhem. Um muro social divide duas lâminas em silencioso, permanente combate. Nem de Sartre, nem de Fidel, Berlim ou China. Nem de pedras ou rosas. Nem de tucanos ou de urubus; a dividir vontades e idéias.
Muros deveriam servir somente às artes e encartes. Espaço de contato entre os olhos e o simples belo. Reações, transgressões: imagens inipócritas do eterno conflito entre bem e mal. Cabem ás manifestações e expressões do espírito como luvas aos dedos de Deus. Mais que divisor, um elo entre liberdades: eis ao que serve um muro.
Do pincel que se aproxima à tinta que tinge o muro há rimas de liberdade na via entre claro-escuro. Há meios inventando recomeços que não têm fim.
- Há um muro entre nós!
- Não, nós é que nos colocamos entre muros!


ÍMÃ
Newton Baiandeira
A gente respira fagulhas de ferro.
Alguém controla o ímã.
A gente anda na linha, dóceis vagões humanos.

LADEIRANDO
Newton Baiandeira

No céu a lua. No chão a rua. Via de regra, a rua sobe ou a lua desce e quase se tocam. Cidade de morros, Itabira, seus altos e baixos.

IMAGENS
Newton Baiandeira

De qualquer ponto da cidade via-se o Pico do Cauê e de lá, Belo horizonte. Os meus olhos jamais deixaram de rebuscar essas imagens, de recomporem essa visão para as novas gerações.

MEDITAÇÃO
Newton Baiandeira

Virá do ato a conseqüência.
Da inocência a sabedoria.
E na agonia do entremeio
a alma fatigada buscará a paz.

A LENDA
Newton Baiandeira

Tem uma serpente no subsolo de Itabira. A cabeça dela fica debaixo da Igreja do Rosário e sua calda embaixo do Pico do Cauê. Dizem que no dia em que o minério acabar, a fera vai reagir. E ninguém sabe medir a força de sua reação.

COLÉGIO SUL-AMERICANO
(tombado pelo IEPHA)
Newton Baiandeira

Ali dentro, inquirido, respondi a todas as questões. Aqui fora, me perguntaram o que era Tombamento e eu não soube explicar.

EXAUSTÃO
Newton Baiandeira

A ação do tempo esculpindo belezas perturba o ego do homem. O tempo não pode impedir o fenômeno da criação. O homem não sabe conter o seu ímpeto de destruição, sua saga. É como uma praga. Embriaga-se da vida e se mata.

TEMPO
Newton Baiandeira

Passado de ferro
Presente de pedra
Futuro de aço.
Inoxidável poesia itabirana
Indecifráveis homens de ferro.

A LENTE
Newton Baiandeira

Não me choca o minério arrancado.
Dói-me a paisagem deformada.
Fere-me a imagem perdida na memória.

CASA DO BRÁS
Newton Baiandeira

Miro a casa recém-retocada, entro. Ouço minhas pisadas. Ou passos do passado ecoando no presente? A emoção me dá asas, vôo, cômodos a dentro. Madeira e barro num desenho lógico me acomodam e incomodam. Quadros em paredes brancas revelam imagens, retratos de quem soube com maestria captar o que se passava entre luz e sombra na Itabira de seu tempo.

BASTANTE
Newton Baiandeira

A cidade de pedra, a pedra da alma dos homens; os homens de ferro, o ferro malhado a frio preenchem qualquer vazio que ouse aportar esse coração.

EM TRÊS TEMPOS
Newton Baiandeira

O homem do passado levou a terra à exaustão. No limiar da grande catástrofe, o homem do presente busca na preservação da natureza, meios de transformar o que ainda resta, num ambiente digno de acolher as gerações futuras. Meio-ambiente: O único meio de salvar a gente!

ITABIRA
Newton Baiandeira

Itabira é o verso que não tem rima. A magia que surpreende o mago. O primeiro trago no cigarro, após o café da manhã.
Itabira é a oração que o padre não aprendeu. A poesia que o poeta perdeu. A canção que não encontrou intérprete.
Itabira é tocar o horizonte com os olhos, abraçar o infinito com desejos e nunca tê-los escravos.
Itabira, meus senhores, é daqueles grandes amores que, por não sabermos amar, fechamos no peito e chamamos de saudade.

CAMARIM
Newton Baiandeira
Ao final do grande espetáculo amar a dor. Assim como o amor que nos foi tanto e farto. Como um parto que dói e dá frutos.

sábado, 18 de setembro de 2010

A ALMA DO FERRO

A cidade de Itabira completa 162 anos de emancipação política. Carlos Drummond de Andrade, 108 de nascimento. A cidade comemora com festa. E o cantor, compositor e poeta itabirano, Newton Baiandeira celebra com seu outubro poético:

A CIDADE, O POETA, A ALMA DO FERRO

A casa é grande, a noite maior, o medo demora mais no quarto. A cabeça coberta deixa o corpo molhado, mas nada passa de assombro pelo veludão. A gameleira frondosa caindo sobre a janela abriga a coruja. Maldita coruja! Eu não a conheço, mas sei que ela quer me pegar. Tuturututu! Seu canto, como garras, rasga meus tímpanos. O cobertor me sufoca, mas eu sei que ela entrou, que já está no quarto. A lua grande e branca cercada de sombras passa vagarosamente pelo vidro da janela. Greta de coberta, eu vejo noites de medos meninos. Sou até a alma arrepios.

À esquerda, chão de terra, o morro abaixo leva á porteira da fazenda. É lá que mora “Nota”. É uma mulher muito bonita, contam. Sabe, toda sexta-feira à meia noite ela toma uma surra não se sabe de quê ou quem. Da última vez a polícia a encontrou na manhã do sábado, toda ferida. Apanhara muito e fora deixada amarrada de arame farpado na porteira. Á noite, eu sempre ouço o vai e vem triste da porteira. A mata que fundeia a casa, dizem, guarda muitos espíritos ruins.

São 6 horas de uma manhã de sol e calor e as minhas irmãs vão pra escola. Setenta e cinco degraus da mais longa escada de pedras levam à estrada principal, lá em baixo. A carroça do leiteiro passa às 10 horas e o burro cansado pára pra comer o capim da beira. São seis garrafas de leite no engradado e não pesa tanto ao menino quanto a carroça ao burro. Setenta e cinco degraus para cima, agora assim, o sofrimento da volta. Não é qualquer cansaço da subida que dói. Distância e demora pra retomar os brinquedos largados à grama é que martirizam o moleque. Por fim, café tomado, vou me chafurdar na grama, montar o carneiro e perseguir galinhas até à hora do almoço.

Minhas irmãs já vêm da escola e a música mais bonita que meus ouvidos sabem contar ecoa em suas vozes:
“Este grupo, este bairro, esta usina
Acesita é uma grande poeta
A vanguarda que afinal nos ensina
Tudo aqui, cada qual é um afeto
Carlos Drummond de Andrade
Todas as pedras do caminho
Este grupo escolar vencera
O brá, gibi, giribi, brá, brá,
Vencerá, vencerá, vencerá.”

Um senhor branco e louro, de olhos azuis e outros traços alemães, convidara meu pai a vir pra Itabira, Prometera-lhe emprego na Companhia Vale do Rio Doce. Confiante meu pai abandonou a Usina em Sá de Carvalho. Juntou a família, botou a mudança nas mulas e veio. Promessa não cumprida, meu velho viveu apenas alguns dias de decepção, um exato mês. Deixou viúva e seis filhos, eu segundo caçula dos homens.

Quando aqui cheguei tinha seis anos. Carlos Drummond de Andrade, se até então fora apenas um prédio escolar na minha memória infantil, era agora um homem. E poeta, o maior entre todos. Itabira, a Cidade do Ferro, sua terra. Mais que Cabral ou Colombo, eu descobrira um novo mundo, ganhara um amigo ilustre e todas as nuances de uma avassaladora paixão. Criança pra compreender, gigante para amar, era eu! “Carlos Drummond de Andrade, todas as pedras do caminho...” O refrão do hino da Escola de Acesita não saía da minha cabeça.

A cidade parecia odiar o seu mais ilustre filho. Poucas pessoas do meu convívio seja nas ruas, no Grupo Escolar Cel. José Batista onde eu estudava ou mesmo na vila em que eu morava, se contava nos dedos aqueles que rendessem homenagens ao autor da frase maldita: “Itabira é apenas um quadro na parede.” À melancólica expressão da frase somava-se uma ira incompreensível. Ó Deus, meu prédio escolar, agora homem e então poeta, corre o risco de ser linchado e não tem “O Fantasma” que o salve dessa gente ruim! Eu tinha nove anos, pareciam cinqüenta. Bastiana, só Bastiana! Minha mãe sabia minha cruz.

Não sei se por compaixão infantil, mas a paixão não tardou em me tomar o peito e tudo que fiz dali até muitos anos foi buscar o poeta onde houvesse alcançá-lo. Professores, jornais, placas do comércio, qualquer informação servia. Informações, poucas e quase sempre rudes. Conhecer a obra de Drummond, “isso é lá coisa de menino? Na Escola faziam festa pra ele. Professores recitavam alguns poemas, mas falavam muito rápido, de não dar pra decorar. No recreio eu era um solitário quando o assunto era a polêmica drummondiana. Assim, levei anos pra conhecer um poema de Drummond por inteiro.

“Alguns anos vivi em Itabira, principalmente nasci em Itabira” e “No meio do caminho tinha uma pedra” em minhas “retinas tão fatigadas.” Era assim que eu misturava o pouco que conseguia da obra do poeta. Eu destacava o “principalmente nasci em Itabira” como contraponto à maldita frase que se referia ao quadro na parede. E muitos daqueles que juravam ódio pelo moço me davam moedas pra que eu recitasse aquela ajuntada poética. Riam, mas pagavam. Sei que recitando fragmentos de Drummond ou cantando as velhas canções que meu pai me ensinara e minha mãe não cansava de repeti-las, fiz de becos e ruelas de Itabira palcos e platéias, generosas remuneradoras.

Quando comecei a compor minhas próprias canções, escrever meus poemas, minha mãe dizia que esta seria uma carreira difícil porque em cada dez de minhas composições nove se referiam ao poeta ou à cidade. Eu respondia a tudo com mais músicas e poemas:
Minha vida é só um trem encantado
Carregado de minério em pó
Arrastando mil vagões
Somo solidões com futuros feitos de jornais
Tenho a sensação de Alcatraz
Juventude foi fim de linha
Coca-cola já perdeu o gás
Almas ao meu lado são minha direção
Num formato música/poesia
O meu mundo é nada mais que minerais
Preparando o pão de cada dia.

Assim, outubro itabirano é pra mim como fevereiro para um carnavalesco. Ao invés de três, trinta e um dias de folia; alegorias de ferro, cordões de poesia, blocos de camaleões, noites de mascarados, confete, serpentina, fagulhas de metais. Arlequins, pierrôs e colombinas, mais de cem mil palhaços no salão. Itabira é só um trem encantado: O Trem que Leva Minas.




Continua a partir de 1º de outubro...

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

POR UM ERRO DE PORTUGUÊS

Nosso conceito sobre conhecimento, saber, intelectualidade, inteligência e capacidade é restrito, negligente, discriminatório. De forma que um profissional, ainda que seja péssimo como tal, se tiver diploma superior é doutor e pronto, manda e não erra.

A exibição de um diploma, um discurso aprimorado, uma boa comunicação ornada da melhor retórica, colocam em segundo plano a extraordinária inteligência do povo brasileiro e, assim como uma apresentação esmerada transforma uma peça vulgar em obra de arte, o domínio da língua portuguesa, às vezes erradamente, nos convence que seu proprietário está apto a dirigir nossos destinos.

A educação é fundamental para o ser humano, contudo, nenhum diploma certifica inteligência, sabedoria. Não será apenas por falta de vontade que a maioria de brasileiros não alcança seu canudo. Mas, não basta um português pra navegar em mares de ondas sociais tão bravias quanto os nossos. Educação compreende um imenso e complexo conjunto de matérias, teorias que sem a prática têm reduzido valor e não garantem infalibilidade a “traçadores” de diretrizes e rumos. Uma lição que aprendemos: a despeito de um conjunto educacional, ficáramos submetidos a um diploma de português por uns quinhentos anos.

Teorias e idéias, projetos e execuções, na prática o que esse país precisava em seu comando era de alguém inteligente por natureza, conhecedor por convivência e com um mínimo de gramática acadêmica pra governar os destinos de uma sociedade cabisbaixa pela escravidão assimilada, guerreira pela genética indígena e velhaca pela poção branca administradas ao caldeirão da poção Brasil. Então, e porque não, o Lula (Uma linha/sinal verde do computador acaba de me avisar que o certo seria a Lula). A inteligência, visão e compreensão acima de escolaridades e diplomas; além das palavras decoradas ou faculdades gramaticais: um gênio.

Sábio afeito às ações, superior aos preconceitos e adivinhações de elites universitárias, em oito anos de governo, Lula solucionou os principais e urgentes problemas do país, seduziu o mundo, conquistou a maior popularidade da história dos governantes brasileiros e tem a possibilidade de eleger sua sucessora Dilma Housseff para mais quatro ou oito e até de voltar para mais um mandato.
Enquanto “gênios” da crítica se apegam a gafes ou descuidos gramaticais do fenomenal gerenciador de negócios, expert em diplomacia, o presidente Lula, o mundo o aplaude. E o Brasil acumula pesquisas que apontam pra mais de 90% de cidadãos felizes.

Certo é que em pouco tempo, o país se encontrou consigo mesmo, com seu povo, sua diversidade, sua sabedoria e criatividade. Enfim, descobrimos que não bastava ser bom navegante. Era preciso saber o mar.

Aliás, que ironia, fomos descobertos por um erro de português!


Letra de Música:

PORRE PATRIOTA
Newton Baiandeira

Esses heróis da geração de inconfidentes
Que Tiradentes liderou com precisão
Foram julgados, condenados ao degredo
Botaram o dedo na ferida da nação imperial
Na providência do meu porre patriota
A minha nota não é dólar, mas não abro mão
Bota uma rodada que esses homens, meu irmão
Merecem uma loura gelada no balcão
Eu pago a conta da desmonta da história
Só Silvério não tem glória nem tem vaga nesta mesa
Nem a princesa nem o príncipe do reino, meu barão
Merecem uma loura gelada no balcão
Enquanto houver um só tostão nessa carteira
Mantenha aberta a porta do congelador
Me passa um pano no balcão da nossa história
Outra rodada de memória, seu garçom, faça o favor
Se eu não der conta, anota lá pro mês seguinte
Não se preocupe meu irmão, eu sou trabalhador
Faço a massa, sol a sol, levanto a construção
Mereço outra loura gelada no balcão

Ouça minhas músicas no: www.myspace.com/newtonbaiandeira2

sábado, 19 de junho de 2010

O TOQUINHO

O primeiro respirar compreende a mais profunda dor. O rasgão da luz, tal martírio se recompensa na dádiva da vida.
Logo em seguida, o primeiro tapa de que a boa intenção inserida e força de uma cultura cuidarão de diminuir no futuro seus efeitos traumáticos. Até mesmo a formação dos dentes pro mais doce sorrir pra vida é um ato de dor.

A infância de tombos e escorregões; medos, rasgões, machucados, feridas, cicatrizes, feridas e cicatrizes e de novo feridas. Dores conformadas pelo correr, brincar, viver sem culpas ou tratos com futuros, pela possibilidade de rir-se e sorrir ao redor: o imenso mundo a descortinar-se.

A juventude, a ousadia, a arrogância e a invasão do espaço. Amores e posses perdidas; os grilhões da violência, os pregos do caos, as lâminas do conflito de gerações rasgando, sangrando alma e ossos. Tudo,contanto, ressarcido de sonhos e horizontes, aventuras e vôos de todo espaço. A liberdade dói de prazeres.

A maturidade, a dor de doenças físicas e da alma; o medo da não - ou miserável – aposentadoria. As dores do mundo rasgando os ombros e os cravos da incerteza martelando o espírito: pra onde vamos? Por quanto tenhamos feito pelos nossos a dor de ter sido tão pouco e as lanças de um currículo inacabado formatando-nos inúteis e impotentes. Dores atenuadas pelo compreensivo amor de nossos familiares, amigos e condescendentes. E carnavais lavando as feridas do caos.

Então, a velhice e a vontade de começar tudo de novo, desde o primeiro rasgão do ar. A dor multiplicada em um milhão de vezes por uma segunda chance de vida.

Dores, dores, dores! São muito mais e maiores que os momentos de felicidade que temos na vida. Contudo, vivemos mais quando estamos felizes, por mínima que nos seja essa performance.

Como maior e mais importante que a imensidão da cruz, dos cravos nas mãos e pés ou dos espinhos na sua fronte, é o pequeno toquinho que sustenta os pés do Cristo crucificado: um mínimo toco de madeira, um raro instante de alívio e felicidade para um corpo que carrega todos os pecados do mundo.

LETRA DE MÚSICA

PROCISSÕES
Newton Baiandeira
Displicentemente/
A gente segue em frente/
Paulatinamente, a pé/
Intimando deuses/
Pra milagres santos/
Pra justificar a fé/
Procissões eternas/
De doer as pernas/
Pra se alcançar perdão/
De tantos pecados/
Mal interpretados/
No antro da reflexão/
Obras do demônio/
E esse manicômio/
Asas do infortúnio/
Pairam sobre nós/
Longe dos deveres/
Párias dos poderes/
Agradecem nosso algoz/
Por manter acesa/
A chama da pobreza/
Que sufoca nossa voz.

CICLO
Newton Baiandeira
Nascer, acesa a luz, brincar/
Correr sem se prender ao amanhã/
Sorrir, acontecer, ganhar o sol/
A vida é cheiro de hortelã/
Voar no tobogã; roda gigante/
O sonho preso num barbante/
A vida em volta de um balão/
Rolar nos movimentos do planeta/
Não há boi-da-cara-preta/
Não existe solidão/
Crescer, sonhar, não ter, lutar, sofrer/
Desaprender a ser feliz/
Juntar, poupar, adoecer, juntar/
Poupar riquezas pra amanhã/
Futuro pronto, o coração tá cheio/
Uma carta do correio/
Diz que é o fim da ilusão/
Chorar, se arrepender e rogar praga/
De repente a luz se apaga/
E é o fim da canção.


Ouça minhas músicas no www.myspace.com/newtonbaiandeira2

sábado, 5 de junho de 2010

RELIGIOSIDADE BASTIANA




“Ave Maria do Espírito Santo, amém? Nananananão!”

Fé compreendia mais que rezar e se benzer. Ser católico, apostólico, romano era quase obrigatório. E isto traduzia penitências, joelhos e milho trocando movimentos por horas de mais doer.

Bastiana não abria mão das santas regras. Os dez mandamentos tinham que ser decorados e os cânticos e orações deviam ser interpretadas de mãos postas. Tínhamos que parecer anjos, mesmo quando capetinhas brigando por figurinhas da copa e bolinhas de gude. E todos os domingos eram de missas intermináveis, padres e sermões que faziam mais medo que fé.

“Deus castigará sempre!” E pior: “os justos pagarão pelos pecadores!”
Já que eu ia pagar mesmo, então não me importava de consumir alguns pecadinhos dos menos cabeludos. Infância bordada a beijos de fiéis e beliscões de padres, sei que ser católico dava um trabalho danado.
Contudo os cânticos e procissões me encantavam. A furiosa municipal e suas marchas balanceavam minha alma de sons belos e tristes, nas mais longas procissões.

No dia da criança, nossa festa em outubro, era também dia de Nossa Senhora Aparecida. Um foguetório ao meio dia, lá fora, e presentes pipocando na sala. “Viva Nossa Senhora Aparecida!” Gritavam. E o meu carrinho novo! Eu emendava. E levei muito cascudo por isto.

Enfim, hóstias, pão e vinho administrados, durante a infância e em parte da juventude, fui um bom católico, apostólico e romano como Bastiana desejava. E botei fé nisso. Uma religiosidade bastiana, Deus adiante, paz na guia, foi assim minha vida de criança.

Adulto, se mais convictas são minha crença, esperança e fé cristã, continuo católico. Desses que a preguiça, pecado capital mais censurado por Bastiana, mantém distante das obrigações presenciais aos templos e manifestações públicas. Mas, do meu jeito, cuido de minhas preces e cumpro preceitos do cristianismo. E me encantam todas as formas de credos e religiosidades, principalmente sua rica sonoridade e seus belíssimos rituais. As culturas religiosas me tomam, cativam e enlevam.

De uns anos pra cá, o prefeito João Izael e as autoridades religiosas de Itabira buscam e levam a imagem de Nossa Senhora de Aparecida. Mais que um evento, uma obra que contempla o coração das gentes itabiranas e me encanta, tanto quanto o evento em si, a comoção que os envolve.

Milhares e milhares de pessoas participam dessa festividade. Parece que a cidade toda está lá, e mesmo quando não estou presente ao evento, de onde estiver, participo com louvores. Neste acontecimento eu constato as estatísticas que relatam uma grande maioria católica no município.

Imaginar que o prefeito João Izael e toda essa multidão cultivaram os bagos de milho, beijos e beliscões de uma infância católica, me leva a crer que tal cultura os faz, assim como fizeram a mim, amar com mais amor a nossa Itabira. Bastiana sacramentava a idéia de que o chão que a gente pisa em procissão se torna parte da alma da gente e a gente cuida dele com mais carinho. Assim como as mais importantes obras de concreto, Itabira tem obras espirituais de fazer tremer homens de ferro.

Fervorosos, irmanados aos preceitos religiosos, João e a multidão me fazem lembrar o menino que andava soltando papagaios no adro da igreja em hora de missa. Será que guardam de infância roxidões de sacerdotais beliscões?

LETRA DE MÚSICA:
ANJOS

São Gabriel/
São Rafael/
Meu São Miguel Arcanjo/
Meu Querubim/
Pede por mim/
Cuida de mim, meu anjo/
Virtudes soltas no gás/
Quero a fortuna da paz/
Meu Serafim do além/
Guarda meus passos, amém/
Protege o meu coração/
De toda desilusão/
Asas de Deus/
Cuidem dos meus/
Doces irmãos da arte/
Fazei de nós/ Dedos de Vós/
Pintando em toda parte/
Todas as formas da cor/
Um arco-íris do amor/
Meu anjo, São Gabriel/
Guarda-me dentro do céu/
Meu São Miguel Arcanjo/
Cuida de mim, meu anjo.

Fotos:
1- Artesanato itabirano – Drummond
2- Baiandeira e Bispo Dom Mário Gurgel



Ouça minhas músicas no: WWW.myspace.com/newtonbaiandeira2

segunda-feira, 3 de maio de 2010

O QUE É QUE HÁ COM O BOULEVARD?

Veio a Unifei, eu olhei pro céu e agradeci a Deus. Como valeu a luta! Veio a Concha Acústica, eu emendei a festa e dobrei as preces, a quase joelhos sobre milho.
Já e então, acostumado à evolução do município, eu preparei o maior festão, convidei amigos, desses itabiranos de ferro que cultivam como prazer maior assistir o crescimento da cidade; desses que só querem ver seu chão com mais qualidade de vida e preparado pra receber com gala, nossos filhos e netos.
Qual nada, casa arrumada, mesa posta, fogos ao dispor da chama, e impedem o bulevar?
Que que há, camaradas! Querem estragar meu futuro? Já tinha planejado passeios à tarde com minha neta, resenhas de aposentado, música regada a verde, gente bonita sorrindo pro mundo, e deletam meu espírito assim?
Que é que há, vamos voltar pro Cerca Lourenço de antigamente? Não tá na hora de o indivídual dar vez ao todo itabirano? Ou a cidade de cara suja interessa a alguém.
Lembro-me que a gente vibrava só de trocar lamparina por lâmpada. A gente não tinha teatro, não tinha rádio nem tevê. Agora que tem tudo isso e mais: Concha Acútica, Unifei, Centros Tecnológicos, vamos parar de crescer?
Hoje, mundo globalizado, Internet a mil, gente bonita pra todo lado, vamos ficar valorizando feiúras oportunas?
Pra mim, de feio já basta eu. Itabira merece é continuar se desenvolvendo, ganhando mídias e referências como um lugar melhor de se viver. O tempo de Urubus da João Pinheiro já foi pros aterros sanitários, há muito.
Pombas, pés de pombas! Eu já me via mirando o Bulevar, lá da Concha do Pico do meu Amor. Gente passeando, sorrindo pra tudo e todos. Pensei que a turma do “vamo tirar alguém ou quebrar alguma coisa” já tivesse ido da história. E aí? Os meus convidados, meus netos, quê que eu vou dizer pra eles? Pô, já tinha itabiranos ensaiando biquinhos pra falar bulevar em francês. Cês estragaram a minha festa! Também, nem se colocarem Dom Perignon no bufet eu não vou à sua festa da derrocada, tá bom?


DE AVISO PRÉVIO
Toca pra Paris/
Merci beaucoup nê pa dê qua/
Retirei meu PIS, tô rindo à toa/
Stambul, Lisboa, Bogotá/
Décimo terceiro/
Féria, aviso prévio e tal/
Desempregado, invento sonhos/
Pro futuro, amanhã/
Londres, Berlim/
Varsóvia, Roma, Amsterdã/
Faço um cruzeiro porque sei/
Que na segunda se eu chegar/
Minha família, já pra lá de Bagdá/
Com essa mixaria de indenização/
Vai me levar ao paredão/
No Afeganistão ou no Sudão, sem dó/
Melhor morrer em Cabrobró.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

DITOS POR NÃO DITOS DA BASTIANA

”Gastar bala com mosquito? Isso é coisa de gente fraca, insegura e/ou pretensiosa. Um homem tão forte e poderoso como ele não iria se curvar a reações contra quem considera menor, e é assim que ele nos vê, menores, e (mais pobres é o que ela queria dizer) não se curvaria a tamanha demonstração de fraqueza. Vestir tal indumentária o faria retroceder de suposto gênio a um reles detentor de vaidâncias, pretensiosidades e soberbices! Dizia a mãe a quase berros ao filho assustado e atento.

“Gente inteligente não se irrita ou reage precipitadamente. Reagir por deduções ou interpretações mal feitas, isso lá é coisa pra pseudócia. Ele, não cabe nele vestir carapuças. Ele é um senhor muito bem formado e por trás do jeito carrancudo um homem de bom coração. No máximo, minha criança, ele vai te passar um pito e só. Não é por qualquer capim seco que o burro vai dar coices. Pode dormir tranqüilo que o Bicho Papão não vai te pegar.”

Bastiana tinha uma forma peculiar de criar a prole. Suave ou ríspida, sua educação se sustentava em ditos populares ou frases que ela mesma inventava, num vasto repertório de espontaneidades.

Mas o menino não dormiria tão rápido sabendo que pesadelos o consumiriam naquela noite. Matara o pavão do Mestre? Nem tanto, mas, se não mentira ao confessar o crime, omitira seu potencial.

Na verdade, vira o cavalo baio e a égua rajada em pleno estado de cio. Pior, jogara pedra neles, como fazia com os cachorros trancados em cadelas.

“Ah, safado! Sem vergonha!” Gritara contra os eqüinos. O dono dos animais, sem que o menino percebesse, assistira a tudo. Seu grito ensurdecedor (“ah, moleque!”) fez o garoto sair em disparada pra qualquer mato mais perto, e lá, chicotes e talas, canivetes e facões, cintos e tacões de botas pisaram sua imaginação, rasgaram suas carnes e dançaram em sua alma.

Quase noite, voltara decidido a contar a mãe o acontecido. Omitiu as pedras atiradas e deixou à boa mostra apenas os xingos aos animais e a reação falada do Senhorzinho.

Não havia ali nenhuma carapuça buscando encaixes. O menino, deveras cometera o desastre e fantasmas, com toda a justiça, o puniam.

Bastiana dormiu certa de que gênios não se precipitam nem agem por interpretações ou suposições, sábios não se deixam vestir carapuças e grandes não se dão a pequenices. “Decerto ele compreenderá que o moleque não o xingara, referia se aos animais.”

O garoto, mea-culpa, fartou-se de lutas com dragões e almas de outro mundo por toda a noite.

O Senhor, sensato e lógico, deu o devido tempo ao fato e, maturação completa, procurou Bastiana e relatou o real acontecimento.

Por fim, contemplações consideradas, terríveis varas de marmelo conformaram apenas e oportunos pitos a sagradas promessas de “nunca mais eu faço, mãe!”.

LETRA DE MÚSICA

RUSTICIDADES

O que será do amanhã/

Além do Rogai por nós/

Se, quando a sós, Deus se negar/

Há que soltar a voz/

Há de brigar pelos seus direitos/

Feito um sujeito de bem/

Há que contar ideologias/

Ou ser escravo de alguém/

Há que pegar na construção/

Dar liga à massa, ralar/

Há que inventar, criar, fazer/

Acontecer, ganhar/

Há que suar o seu próprio rosto/

Pra ver o gosto que tem/

Há que aprender quanto vale a luta/

Para ser um homem de bem/

Sem nada mais a dizer/

Muito prazer, siga em paz